Boyhood (Richard Linklater, 2014)

 

Ao acompanhar um dia dos desajustados sociais texanos em 1991, Richard Linklater ajudou a cimentar um meandro comportamental que batizou seu filme e que depois foi associado apenas ao movimento de boicote ao trabalho – Slacker. O filme, que se apoiava no fluxo do tempo e na forma que os personagens enfrentavam o andar do dia foi nomeado ao grande prêmio do Festival de Sundance no mesmo ano. Em 1996, Suburbia era lançado. O filme acompanha através de um curto espaço de tempo e um pequeno espaço cênico – um posto de gasolina e seus arredores - o peso que a vida adulta traria para este grupo de “slackers” que lentamente assemelham a ideia que tudo está prestes a mudar.

Estes dois exemplos mostram como Boyhood parte de um princípio utilizado com certa frequência na filmografia de Richard Linklater: o tempo como sustentação. O filme que acompanha Mason da infância ao momento em que entra para a faculdade se resume a um jogo de elipses muito coeso, pois o maior desafio é de manter a ideia de fluxo – o passar dos anos - entre tantos cortes. A sensação que se dá é que Linklater resume o filme como antítese ao cinema de James Benning (curiosamente presença constante na sala de edição de Boyhood). É um filme de retrospecto, onde são pincelados momentos de aflição, afirmação e claro, de amadurecimento.

Boyhood, assim como Suburbia ou Slacker, não se inclina a qualquer tipo de drama. Os conflitos são presentes, mas o fluxo continuará como norte principal da narrativa. Como abrir um álbum de fotografias, lembrar-se de uma determinada época por alguns minutos e seguir em frente. Logo estaremos em outro local, com outras motivações, outros amigos e outra noção de vida. 

O que há de mais interessante em Boyhood é como Linklater nos dá o papel de nostálgicos e deixa seu protagonista como vivente. Mason passa pela vida sem olhar pra trás, como se estivesse sempre em busca do melhor. O espectador, passivo, ficará com os rastros, com a sensação de que o melhor está acontecendo e escapando das mãos a cada quadro, pois não há espaço para proveito. Esta maneira de esculpir uma parte da vida sugere este olhar para trás.

E por esta percepção, Boyhood vai lentamente de encontro ao que era seu oposto. A noção de explorar o momento e o tempo oferecido, suas formas e possibilidades. Se Boyhood é um resumo de fragmentos repletos de sentimentos e diferentes formas de compreensão da vida ao longo de doze anos de filmagem, ele exprime sua concepção de forma que é possível interagir com o básico, sem que nenhuma imersão domine o filme. E assim fica ainda mais interessante pensar na presença de Benning na sala de edição e como o diretor norte-americano - com quem Linklater protagonizou o belíssimo documentário Double Play dirigido por Gabe Klinger - faria Boyhood: provavelmente em um único plano que entoasse a infância e a juventude.

Boyhood (Idem, EUA, 2014) de Richard Linklater

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