Tropykaos (Daniel Lisboa, 2015)

Eis um filme de reflexos constantes. Tropykaos encena, a cada sequência, a ideia de isolamento, de um microcosmo como comentário direto ao “mundo alheio”. É a analogia mais prática à vida de um artista no Brasil, principalmente aos que fogem dos padrões impostos pela indústria. Como um delírio – talvez não exista colocação melhor para essa escolha -, Guima, poeta assolado pela tempestade solar numa Salvador prestes a receber o carnaval, precisa de seu ar-condicionado para trabalhar.

Embora as abas deste tema sejam infinitas, principalmente as impossibilidades de realização e a tentativa em vão do diretor Daniel Lisboa de abraça-las a todo custo, Tropykaos é mais interessante quando constrói uma neurose descompromissada, apoiada no cotidiano da cidade e sua cultura incompatível ao gosto e à realidade de Guima. São nesses momentos que Lisboa remete a filmes-símbolos dessa discordância como SuperOutro de Edgard Navarro (que está presente no filme com três personagens hilários) e Depois de Horas de Martin Scorsese. 

À medida que esse contexto alucinado caminha para soluções assombrosas – muito utilizadas para justificar a realização possível no Brasil, como uma ilha de pedras e sem uma saída definida – Guima carrega uma melancolia, um lamento; desconta em escapismos e na autodestruição que Lisboa contrasta com a beleza da cidade. São monumentos a serviço do outro, do folclore e daqueles que compram camarotes e que estragam aparelhos de ar-condicionado. É desta revolta silenciosa e ao mesmo tempo impossível que o protagonista toma suas escolhas – encolher-se como um vampiro ao sol, saber da sua condição de antagonista em sua própria casa.

Como um crescente frenesi para lidar com o calor e o quadro de saúde de Guima, da luta contra a “ultra violência solar” e sua incompatibilidade aos padrões de uma cidade “solar” vem a solução: se influenciar pela urgência serve como a saída crítica mais palpável. É a forma de unificar tantos problemas a citar – em certos momentos Tropykaos parece mais um conjunto de alegorias que um discurso sobre o que exibe – e criar assim a noção de uma jornada. A noção de identidade do outro, sobretudo àqueles que não se adequam às regras básicas de sociabilidade e até mesmo artísticas – produzir com as amarras do governo é um ótimo exemplo.

É importante lembrar que Tropykaos é o registro de uma circunstância histórica acima de qualquer jogo delirante; mesmo que desequilibrado pela mesma urgência registrada (que o faz correr atrás de inúmeras justificativas). É do impossível que Lisboa tira sua melhor saída, uma contestação tão pertinente quanto infantil. É importante ser infantil neste momento, a não ser esquecida pelo seu lado inusitado e inconsequente. É da imprevisibilidade que o filme grita sua revolta e diagnostica o país do samba, suor e feridas.

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