Festival do Rio (Parte 2)



 A Forma da Água de Guillermo Del Toro

A fabula dos desajeitados é asséptica e formalista: momentos de horror, alívio cômico e romance. A perspicácia de Del Toro é formar o senso de unidade a esses elementos com sucesso. Um filme bem limpo para um campo extremamente sujo.


Más Influências de Claudia Huaiquimilla

Um filme coming of age com um esforço dispensável de chegar próximo aos americanos. Para distrair este olhar, o filme insere uma carga de regionalismo igualmente dispensável para uma nova leitura, de criar um nó na garganta que seu extremo oposto já havia sugerido de outra maneira.


Florida Project de Sean Baker

Belo exemplar de como extrair o melodrama pela dramaturgia; A estrutura de Florida Project é de um filme denso, mas o que se vê é um conto moderno sobre a América em crise visto com ternura e bom humor, ainda que o lamento esteja incrustrado em cada quadro.


As Boas Maneiras de Juliana Rojas e Marco Dutra

A primeira metade, a de inflexão, é muito boa. Toques de suspense e um mundo de referências ao cinema e as complexidades do Brasil da era Temer. Já a segunda, um filme de convenções, infantil – sobre qualquer ótica -, que enterra mais referências visuais ao imaginário e as possibilidades do gênero e estica o filme até onde pode para reforçar este raciocínio.

A Câmera de Claire de Hong Sang-Soo

Deliciosamente honesto. Mais um olhar sobre o cinema, desta vez pelo ego, insegurança, mercado e arte. As inclinações de Sang-Soo aqui são muito complexas e surpreende como o arco dramático é cada vez mais simples e como as imagens ficam cada vez mais econômicas. 

Piazza Vittorio de Abel Ferrara

Análise antropológica do local que batiza o filme e como o mesmo passou por mudanças radicais de estrutura e espírito nos últimos anos, como um espelho de fácil associação à Itália, boa hospedeira para imigrantes. Ferrara analisa as possibilidades de recomeços e como o local é a antítese (ao menos visualmente) para esta possibilidade – que reserva um cotidiano duro e pouca prosperidade.

Alanis de Anahí Berneri

O famoso filme “mundo cão” que nega ambientes e dá aos corpos autonomia para guiar a narrativa. Um filme muito padronizado neste sentido, reacionário à diluição do drama, implicando à observação do cotidiano de uma prostituta despejada através de “dogmas do mal estar” produzido por Iñarritú, entre outros. 
O diabo e o Padre Amorth de William Friedkin

Espécie de potencialização duvidosa do próprio trabalho em O Exorcista a justificando pela investigação científica e espiritual de exorcismos. Mais parece um extra de DVD tamanho o protocolo de Friedkin em sua abordagem – até mesmo no interminável plano do ritual de libertação de uma jovem possuída. 

Centauro de Aktan Kubat

Enquanto é um filme subjetivo sobre liberdade e amor conforme acompanha de maneira idílica a busca por um ladrão de cavalos, Centauro funciona. Quando Kubat resolve transparecer suas intenções, já no terceiro ato, vira um filme antiético na forma que escancara ideologias sociais e sua ideia de liberdade.


Legalize Já! de Johnny Araújo e Gustavo Bonafé

Ser cognitivo ao futuro do Planet Hemp é o acerto do filme que possui uma estética de flashback e elos imaginários para diálogo entre passado e futuro enquanto narra a safa de dois jovens perdidos na era Collor. Antes de uma autocelebração, esta é uma autoficção. 

Milla de Valérie Massadian

Há em Milla doses cavalares do cinema de Chantal Akerman, em especial a máxima de que “nada acontece”, principalmente a de Jeanne Dielman. Aqui Milla faz as vezes de Dielman adolescente em um filme muito duro sobre utopias, realidade e dor e usa o tempo como grande monumento a ser adorado enquanto o mundo despenca para a protagonista.

Bom Comportamento de Ben e Josh Safdie

A ideia de fazer um filme de ação fantasmas é muito boa porém mal justificada e irregular já que a linguagem tradicional do cinema dos Safdie nortea o filme entre um ou outro macete de filmes de gênero – o mais notório dele os planos de helicóptero. Pouco sobra para o diálogo entre estes pontos, como se o rigor estético fosse uma panóplia jocosa para que o filme faça algum sentido.

Ao Vivo na França de Abel Ferrara

Captar a preparação de Abel Ferrara e seus amigos músicos para uma série de shows parece uma boa ideia, já que o mesmo estaria na França para debates durante uma retrospectiva de filmes. Porém Ao Vivo na França traz a estranha sensação de que estamos diante de uma egotrip muito estranha do diretor, onde o mesmo domina o espaço e libera o alívio para os “protagonistas” da história, sempre lembrados que estão em segundo plano e que há um “diretor” a guiar.

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