Festival do Rio (Parte 2)

 O Ornitólogo (Idem, João Pedro Rodrigues, 2016) 

O evangelho segundo João Pedro Rodrigues é exatamente o que se espera dele; percorre terreno do indevido, da solidão, das representações visuais e de um discurso a favor da tradição, porém contra a religiosidade. Onírico e igualmente assustador, o caminho no deserto é o lugar para ver uma vida inteira – das tentações à crucificação, de Judas a Tomé. Ornitólogo pode ser uma análise científica do que não se vê. 

 Tramps (Idem, Adam Leon, 2016) 

Adam Leon faz mais um filme de aventura pelas ruas de Nova Iorque após seu tributo involuntário a Spike Lee em “Gimme the Loot”. A premissa é a mesma, englobar o ambiente e tensão justificados por um fio narrativo. Em Tramps trata-se da busca por uma maleta que desenvolve como um romance bem humorado com as amarras deo suspense justificados por uma gangue do Brooklyn. 

 Personal Shopper (Idem, Olivier Assayas, 2016) 

O filme americano definitivo de Assayas. E não surpreende que ele pareça com um filme de M.Night Shyamalan. Um jogo de espectros, inclinado à cafonice, um completo controle de direção – uma sequência de 20 minutos dividida em ação e uma longa conversa por celular, por exemplo – que justifica sua trama com um interesse muito maior no lado espiritual sem amarras com a subjeção. 

 De Palma (Idem, Noah Baumbach, 2016) 

Brian De Palma frente à câmera, livre para comentar sua filmografia cronologicamente e sem opinião de terceiros. O monólogo tem alguns bons momentos, especificamente os detalhes sórdidos de filmagem e repercussão dos filmes, que não tiram o ar superficial de extra de DVD. 

 Dog Eat Dog (Idem, Paul Schrader, 2016) 
A degradação moral da América. Schrader faz um inventário completamente despudorado e hilário sobre o que já foi filmado sobre o assunto. Dog Eat Dog encontra-se na crítica direta ao sensacionalismo que o cinema americano cria como manobra para vender ingressos, sem apegar ao que há de mais importante – o lado soturno de seus personagens. E por isso Schrader gerou repulsa de críticos e público, porém o que se vê é um registro inflexível de um país. 

 Os Garotos nas Árvores (Boys in the Trees, Nicholas Verso, 2016) 


O imaginário adolescente sobre o terror. Um filme muito particular de Nicholas Verso, permeado pela nostalgia – ilustrada por canções de bandas dos anos 90 – e de cuidado estético primoroso. Ainda que tudo seja resolvido na primeira hora e que o filme anda para o caminho de uma saudosa declaração, há uma força em cada plano do filme para justificar este sentimento. 

 Boris Sem Beatrice (Boris San Béatrice, Denis Coté, 2016) 

Uma comédia sobre a consciência burguesa ou a completa falta da mesma. Coté é mais conciso num jogo de chiaroscuro – só existem cenas em ambientes extremamente claros ou escuros – a caminho do inevitável. Um filme de corpos encostados das mais diversas maneiras. 

 A Região Selvagem (La Région Salvaje, Amat Escalante, 2016) 

Filme que faria sessão dupla com Boris Sem Beatrice, pois também aborda a consciência, dessa vez pelo lado visceral. Escalante continua sua abordagem social, talvez mais perto de Bastardos do que Heli onde o realismo fantástico é chave moral para costurar questões minuciosas do “mundo cão” de Escalante. 

 Capitão Fantástico (Captain Fantastic, Matt Ross, 2016) 

O primo distante de Pequena Miss Sunshine. É o sucesso indie do ano, a aventura da família diferentona e tão caricata ao mesmo tempo, a do bem contra o mal, ou melhor, o capitalismo. Capitão Fantástico sobrevive graças às alegorias, sempre elas sustentadas por uma justificativa: é possível viver de outras formas. E como se espera, há conflitos sobre o que é “viver de maneira correta”. Um exemplar do que há de pior no cinema americano atualmente.

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