VIPS

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Conhecido como o “golpista da Gol”, Marcelo Nascimento virou objeto de estudo no livro “Vips – Histórias Reais de um Mentiroso” e recentemente no documentário homônimo dirigido por Mariana Caltabiano. Vips, o longa de Toniko Melo (que conta com Fernando Meirelles e toda sua trupe por trás do filme) abraça a licença de uma adaptação à exposição do lúdico como representação dos conflitos de Marcelo representado por Wagner Moura (como sempre, exemplar).

O contraponto – e grande trunfo do filme - está na ausência de trivialidade dos golpes no filme. Eles não são consumidos pelo sensacionalismo que aguça a curiosidade do público que é convidado a conhecer outro Marcelo, motivado a alcançar o sonho de se tornar piloto de aviões.   A narrativa, em harmonia, supre a linearidade com dinamismo e o já citado lado lúdico da história.

Vips é um daqueles filmes que te pegam pelo pé. Que você espera uma coisa e vê outra completamente diferente e no fim se pergunta muito mais sobre as motivações de Marcelo para viver seu sonho à força do que pela façanha de ter conseguido.


Vips (Idem, Brasil, 2010) de Toniko Melo

SUCKER PUNCH - MUNDO SURREAL


Pelo histórico, Zack Snyder é um cineasta fetichista pelo imagético. Em Sucker Punch – Mundo Surreal, o diretor leva seu ode ao extremo, transformando o longa num exercício ilustrativo, dispensando a priori dos gibis: é preciso manter conteúdo e narrativa no mesmo patamar do impacto visual.

Nos primeiros minutos do filme, o texto justifica o surrealismo imposto mais pela pretensão visual ao conteúdo. De fato, Sucker Punch é um espetáculo estético que abraça a multiplicidade de possibilidades de um filme que se passa num centro de tratamento psiquiátrico. E lá está o maior clichê: para fugir das garras do grande vilão (o dono do centro, logicamente), Babydoll e suas companheiras figuram memoráveis sequências de ação regidas por canções pop e ilustradas detalhadamente pela tecnologia com cortes que remetem aos quadrinhos.

Na obsessão estética, Snyder dispensa conflitos ou o estudo do âmago de suas personagens, buscando apenas um bom motivo para inserir as longas sequências de ação ambientadas em temáticas clássicas do cinema: medieval, futurista, oriental e a segunda guerra mundial. Usando sempre o mesmo método para pontuar tais sequências – que revelam a pobreza do roteiro -, Sucker Punch vai ofegante à resolução, aproximando o texto ao lírico após o caos visual construído em duas horas. Tarde demais.

Sucker Punch - Mundo Surreal (Sucker Punch, EUA/Canadá, 2011) de Zack Snyder

NÃO ME ABANDONE JAMAIS

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Não me abandone Jamais é um paradoxo de 103 minutos.  A luta de Mark Romanek (consagrado como diretor de vídeo-clipes) para fugir de convencionalismos vai da temática mambembe que se justifica a gratuidade à falta de senso ao tentar distorcer a visão sob um gênero, ao contrário do livro de Kazuo Ishiguro no qual o filme é baseado. Os personagens (clones sustentados até a vida adulta com o propósito de doar órgãos aos seus “originais”) não são iconoclastas – algo que tornaria o filme um estudo da alienação e submissão, apesar de em certos momentos colocar tais assuntos em pauta.

Distorcendo a dimensão do tempo e a relação de personagens, tudo parece se complicar e resolver facilmente. Junto, está a fuga de gêneros, onde a abordagem existencialista cai em clichês de romances (em estética e texto) convencionais por mais que a temática tente impor outra interpretação.

Não me abandone Jamais tem acertos, como a analise e efeitos da arte na alma, do já citado estado de submissão e ao abordar a lobotomia infantil como um alicerce político, mas, por passear por extremos, o resultado é irregular. Sustenta-se pelo ritmo e por gerar expectativas a cada ato, mesmo caindo em contradição ou redundância na busca pela originalidade.


Não me abandone Jamais (Never Let Me Go, Reino Unido/EUA, 2010) de  Mark Romanek

CÓPIA FIEL

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Os personagens de Juliette Binoche e William Shimmel em certa altura de Cópia Fiel conversam sobre novas visões sobre um aspecto ou produto. É apenas uma das milhares de analogias sobre a moral do novo longa de Abbas Kiarostami. Este que se entrega apenas como um maestro de belíssimas e longas sequências, brincando com a arquitetura de Arezzo, cidade da Itália. Sua câmera tão invasiva em planos subjetivos, também se torna voyeur e paira na simplicidade do plano e contra plano.

Apesar de remeter a outra obra-prima do diretor, 10, Kiarostami entrega um filme inventivo. Diálogos se tornam implícitos pelas própria potência. Relações conjugais podem ser o cerne da discussão (filme/platéia) sobre nossa falta de personalidade e os motivos de sermos tão banais, óbvios e cheio de sentimentalismos baratos. Mas, é um leque gigantesco de questões , construído através da metalinguagem. Cabe ao espectador criar sua própria temática.

Cópia Fiel é uma aula de cinema como há muito tempo não se via. Atravessa por extremos técnicos e líricos despachando experimentalismos sem dispersar o interesse pela narrativa, fora os inspirados protagonistas.

Cópia Fiel (Copie Conforme, França/Itália/Irã, 2010) de Abbas Kiarostami

EM UM MUNDO MELHOR

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Ex-integrante do Dogma 95, Susanne Bier ainda expõe resquícios estéticos em seu novo filme, Em um Mundo Melhor. Lá estão os cortes secos e a derrapante câmera na mão para resgatar alguns dos mandamentos do movimento que justificava o baixo orçamento de seus filmes banindo macetes usados em Hollywood. Ironicamente, Bier fora premiada recentemente com o Globo de Ouro e o Oscar, ambos na categoria de melhor filme estrangeiro.

Permeando tópicos que potencializam a discussão sobre os direitos humanos, Em um Mundo Melhor tem como guia narrativo a vida do médico Anton, que em seu trabalho voluntário na África atende vítimas de um psicopata. Em casa, enfrenta o termino de seu casamento e a turbulenta vida de seu filho, vitima de bullying e que alimenta revanches graças a uma companhia não muito agradável.

Bier analisa a tênue linha que há entre o controle e a violência. Adiciona a receita as frustrações de lares destruídos pela morte ou o distanciamento na relação entre pais e filhos e, por narrar seus conflitos pela visão do médico, explora extremos sem destoar do tom inicial.

Por outro lado, Em um Mundo Melhor cai na armadilha comum que um texto proto-panfletário carrega; cria momentos de extrema dificuldade de assimilação por conta de sua pieguice e no exagero melodramático. Se por um lado Bier, consegue criar um quadro complexo do comportamento humano, por outro apaga o impacto por tamanho sentimentalismo.


Em Um Mundo Melhor (Haevnen, Dinamarca/Suécia, 2010) de Susanne Bier

11 FILMES PARA 2011

Findada a época do Oscar, a garantia de bons filmes nos cinemas já não é mais a mesma (não que o Oscar signifique qualidade constante, mas enfim...). Não temos total certeza da grandiosidade destas obras, mas alimentamos grande expectativa por elas. Por isso, listamos 11 filmes para 2011:

THE GRANDMASTERS 

Wong Kar-Wai conta a história do mestre de Bruce Lee e vai de encontro à sua filmografia de temas - em sua maioria - introspectivos. Isto só aumenta a curiosidade pela abordagem de The Grandmasters.

DRIVE 

Nicolas Winding Refn tem feito filmes maravilhosos nos últimos anos. Por aqui, eles foram ignorados, inclusive em festivais. Drive conta Ryan Gosling, Carey Mulligan e Ron Perlman no elenco e marca a estréia de Refn no “mainstream”, já que o roteiro foi produzido para Neil Marshall para Hugh Jackman protagonizar. O longa é baseado no livro homônimo de James Sallis.

 O PALHAÇO 

Selton Mello volta à direção de um longa-metragem numa história sobre um artista circense em conflitos existenciais, numa espécie de espelho do diretor que durante as filmagens estava em crise profissional. No elenco, estão Paulo José e o próprio Selton, que garante que o filme é mais metafórico do que autobiográfico. Dessa vez, o diretor não colocou o cinema argentino ou John Cassavetes como suas influências e escolheu Oscarito e Didi Mocó como norte para fazer um filme “solar”.

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A ÁRVORE DA VIDA

Este é um caso que a demora cria mais expectativa do que outra coisa. Foram muitos anos de espera até o primeiro teaser aparecer na rede. E os poucos minutos dele já foram suficientes para compensar toda ansiedade. A Árvore da Vida tem a peculiar estética de Terrence Malick. No elenco, Brad Pitt, Sean Penn e Jessica Chanstain.

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I’M STILL HERE

Chamem de oportunismo, de loucura, de cara-de-pau, do que quiser. Mas quem não ficou com vontade de ver esse documentário dirigido por Casey Affleck sobre a decadência-proeza de Joaquin Phoenix? Cenas de sexo explícito e uso de drogas compõem esse quadro de intensa entrega ao sensacionalismo.

ON THE ROAD

Walter Salles adapta o livro homônimo de Jack Kerouac com Sami Riley, Steve Buscemi, Amy Adams, Viggo Mortensen, Garrett Hedlund, e a queridinha teen Kristen Sterwart no elenco. A expectativa aumentou com as belíssimas imagens divulgadas.


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RED STATE 

Recentemente, Kevin Smith socou a mesa e comprou a distribuição de seu próprio filme durante o Festival de Sundance. Red State marca sua primeira aventura num gênero senão a comédia e completa a atitude DIY com exibições itinerantes pelos Estados Unidos. Talvez ele esteja desesperado por um sentimento abandonado em O Balconista de 1994. O filme que mais parece um protesto revestido de suspense conta a história de um grupo de cristãos que ao encontrar jovens promíscuos num estacionamento sofrem ataques, digamos, paranormais.

the future miranda july indie
THE FUTURE 

Miranda July finalmente volta à direção após Eu, Você e Todos Nós de 2005. The Future foi ovacionado em Sundance mesmo sem grandes mudanças em comparação ao seu primeiro filme. Mas é dada a hora de termos um norte para sua filmografia.

melancholia melancolia lars von trier
MELANCOLIA
Um filme de Lars Von Trier com esse nome já basta...

os residentes berlinale tiago mata machado
OS RESIDENTES
As frequentes comparações ao filme de Tiago Mata Machado a Jean-Luc Godard chegaram a irritar o diretor, temoroso por novas comparações em seus próximos filmes. Tudo durante o Festival de Brasília, quando Tiago comentou que havia feito uma tese sobre o diretor francês. Convenhamos, tal ligação só aumenta a curiosidade de quem não estava na Mostra de Cinema de Tiradentes, onde Os Residentes foi grande vencedor.

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RISCADO

Destaque do Festival do Rio do ano passado, o filme de Gustavo Pizzi foi o grande vencedor do troféu "boca a boca", pois a cada exibição, mais comentários positivos surgiam sobre o filme que narra a história de Bianca, atriz que espera sua carreira deslanchar em algum momento de sorte. Quando finalmente consegue, o diretor a obriga a enfrentar os próprios demônios em seu tão sonhado papel.

DOIS IRMÃOS


O cinema de Daniel Burman tem a característica de construir relações humanas com proximidade assustadora à realidade.   Em Dois Irmãos, elimina-se conflitos cinematográficos, com gritos, choros e palavras cortantes. Está lá o desconforto do silêncio, a mágoa que incomoda o peito e atitudes egoístas nesta adaptação do romance Villa Laura.

Em devidas proporções, o filme de Burman remete a Expresso Darjeeling de Wes Anderson ao captar momentos comuns numa relação entre irmãos, apesar do filme do diretor argentino ser mais coeso para construir seus personagens e se concentrar nesta relação ao contrário do longa de Anderson.
Marcos e Susana vêem a idade chegar de maneiras diferentes. Mas a certeza é que alguns planos devem ser abortados – decepção à vista. Como irmãos, eles não estão à busca de um apoio mútuo e estão posicionados no roteiro como receptores de uma moral que só vem com o tempo e sofrimento, ou uma tardia maturidade, como preferir.

Dois Irmãos é sobre um período de aprendizado após um momento delicado onde cada um tem sua forma de reagir e se reerguer. É como um abraço pendente, mas que se tem muita vontade de dar. Mas com uma barreira de orgulho a ser batida. Um filme que, antes de qualquer coisa, fala sobre corações, independente da velocidade em que eles batem.


Dois Irmãos (Dos Hermanos, Argentina/Uruguai/França,2010) de Daniel Burman

RANGO


A metáfora de “atravessar para o outro lado” proposta em Rango encaixa em absolutamente todos os elementos do filme onírico dirigido por Gore Verbinski. Atravessamos, de fato, para o passado, onde resgatamos o western spaghetti com precisão estética para narrar a história de um camaleão prestes a enfrentar seus próprios limites para alcançar a glória da reconquista da maior riqueza para de uma cidade arrematada pelas forças da corrupção: água.

Subverte-se a figura do herói em repletas referências que passam por Medo e Delírio em Las Vegas à clara reverência ao diretor Sérgio Leone e um encontro com o homem sem nome, para citar algumas. Rango também traz aura anárquica, como Alex Cox fez em seu Straight to Hell. Cada personagem parece ter sua estranheza necessária para tornar o filme além-tributo, de características e personalidades marcantes e que completam a sensação de espetáculo sugerida por Verbinski, regente de sequências estonteantes por seu apelo visual e potência dramática.

Rango limita-se as articulações do gênero com toda concessões narrativas permitidas pelo surrealismo, como um aval para o diretor debochar dos artifícios obrigatórios, dos personagens e até mesmo da crueza de seu protagonista, sem se vender como um filme “família”.


Rango (Idem, EUA, 2011) de Gore Verbinski

REINO ANIMAL

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Reino Animal transparece o método que lhe foi concebido através do desenvolvimento narrativo. São impressões distintas durante o andamento do filme que foi o grande vencedor de Sundance em 2010. O primeiro ato é agarrado à falácia e elementos da pós-produção para apresentar uma família problemática que sobrevive financeiramente graças ao tráfico de drogas. A câmera de David Michôd registra o “mundo cão” que enaltece no título do filme quando os personagens largam estereótipos e agregam densos conflitos a cada persona a partir da segunda metade do longa.

Atribui-se ao roteiro saídas complexas como um contraponto aos buracos do texto de Michôd, que oscila entre a falta de refinamento e momentos de brilhantismo no comando do mesmo. Ao contrário da primeira metade, o diretor articula texto, elenco e estética, sendo trivial ao impacto do filme.

Como análise de um tempo, Michôd destrincha vulnerabilidades, necessidades e o egoísmo de uma raça que se apóia no egocentrismo para vangloriar-se de falsa alegria ou que toma atitudes ríspidas para alcançar a sensação de saciamento.


Reino Animal (Animal Kingdom, Austrália, 2010) de David Michôd

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