Indie: ATO DE VIOLÊNCIA










O prólogo de Ato de Violência, filme do diretor alemão Lars Henning Jung nos prometia um filme verdadeiramente violento, caido no clichédos filmes de terror: Jovens presos em uma casa no meio de uma floresta, aliado a blusas de bandas de metal e uma queda para a promiscuidade. Mas isso logo é esquecido. Os jovens logo caem no tédio e o estudo de tradições vikings viram proposta de tortura.

A partir dai o diretor nos mostra com os jovens podem se abusar, sem receios e limites, usando o sexo como elemento principal, aliado ao ego e ao "charminho psicológico" (desculpe, não tem outro adjetivo melhor) mas infelizmente com um roteiro tão raso e personagens sem desenvolvimento algum, abusando de situações repetidas por mais da metade do filme. 

Esses buracos enormes, remendados por cenas gratuitas, criam um tédio maior ainda e assim o longa vai passando até seus momentos finais, quando a hipocrisia dos jovens é colocada em jogo. A proposta é boa, mas cai na obviedade novamente, os takes durante o filme inteiro oscilam entre o bom e o péssimo gosto. A violência ficou com o espectador que não reage mais a nenhuma idéia já que seus minutos passados foram em vão e não seria uma saída meia boca para o roteiro que iria salvar o longa nos últimos minutos.


Ato de Violência (Act of Violence, Alemanha, 2007) de Lars Henning Jung

Indie: A CABEÇA DE MAMÃE









A diretora Carine Tardieu constrói o filme A Cabeça de Mamãe de uma forma sensata, dinâmica e leve, mas não consegue sair dos "padrões" do cinema francês ao contar a história da menina Lulu, que vê sua depressiva mãe entregando a vida, com um péssimo casamento e óbvios problemas de saúde, que refletem uma mente auto-centrada e hipocondríaca.

A menina descobre que no passado sua mãe foi muito feliz e viveu um intenso romance. Com isso ela começa uma divertida peregrinação para conseguir resgatar os brilhos nos olhos de sua mãe. Essa que inclui o sexo, um triângulo amoroso, traição, valores e drogas. Tardieu usa o roteiro a favor e consegue dosar com boas doses de humor com uma forma mais amena, para não desandar em um drama mexicano. A menina Lulu também estrela a história paralela, logicamente quando a sua vida pessoal é tratada, focando-se na descoberta do amor e sua consumação.

É uma pena que não traga algo mais que o cinema francês ou outros filmes com proposta parecida não tenham feito, com o roteiro caindo no óbvio, mesmo que tenha sido tratado com carinho. Tardieu usou bem seu elenco e sua equipe, mas a obviedade na construção do filme o torna leve, porém, morno.
★★
A Cabeça de Mamãe (La Teté de Maman, França, 2007) de Carine Tardieu

Indie: ANYWHERE, USA


 
Um estudo sobre os Estados Unidos da forma mais ácida e escrachada possível, com um roteiro poderoso, mas com montagem diluida demais, para uma fácil degustação, para qualquer público. Infelizmente, pois o potencial do roteiro levaria o filme além.
Em Anywhere USA, dividimos a "américa" em três segmentos: Amor, perda e ignorância. A primeira, onde o ponto principal é a neura dos americanos com os árabes, recheada de situações grotescas, hilárias. A internet entra em questão também, quando um típico redneck suspeita da traição da sua gótica namorada pela web, quando descobre pistache no sofá, oriundo do Oriente Médio. As loucuras do redneck e seu ousado amigo anão, vão além das expectativas e o deboche com os estereótipos americanos não param. A internet nos une, mas nos mantém separados. Os bigodes e a inveja são parâmetros de comparação com a vida dos americanos.

O roteiro segue, e na perda, vemos a singela história de uma menininha que vai atrás da verdade sobre a história da "fada dos dentes", onde as mentiras tomam o papel principal da questão. Mentiras dos pais, do governo para justificar as loucuras, levantadas com bastante criatividade pelo roteiro. As drogas também fazem parte desse segmento, mas de forma mais leve, levando mais para um humor inocente.

Já no terceiro e último ato e certamente o mais absurdo dos três, quando uma rica, branca e aparentemente perfeita família, liderada pelo pai, decide criar vínculos com pessoas negras, pois nunca havia conhecido uma, de fato. Vemos que na aparência e na cabeça mais libertária, o preconceito fala e bem alto. O filme é um ácido retrato da sociedade americana nos dias atuais, casada com uma bela fotografia e direção de arte digna de palmas. Os atores estão afiados e levam o roteiro com louvor. O longa é inteligente, mas não possui as bolas de filmes como Felicidade ou até mesmo Beleza Americana para criar um confronto de frente com o espectador, mas funciona muito bem.

★★
Anywhere USA (Idem, EUA, 2008) de Chusy Haney Jardine

Indie: UMA VIDA SEM REGRAS


O diretor inglês Oliver Irving nos mostra uma nova faceta do cinema inglês que novamente aposta na comédia, algo que pode criar a inevitável comparação com o  grupo Monty Phyton, mas é importante citar que a natureza do humor de Uma Vida Sem Regras é completamente diferente. Irving nos mostra uma espécie de versão inglesa para uma comédia independente americana. Irving brinda as ruas inglesas com estilo: Usa as figuras caricatas das ruas inglesas, os hooligans, os pubs, tudo está lá.  Tudo aliado a uma boa escolha de elenco, que vivem personagens pitorescos, com personalidades acentuadas pelo figurino, mas que no fim das contas, não foge do padrão americano.

Arthur se encontra em uma crise que ele acredita ser a crise de 1/4 de vida. Para completar, ele foi abandonado pela namorada e atura um entediante trabalho em um supermercado e mais o trabalho voluntário, onde Arthur  o utiliza para limpar sua consciência. Lá, ele tem sérios problemas para conseguir ter uma boa relação com os portadores de deficiência mental.

Quando Arthur volta para morar com os pais, o conflito com os dois e a busca por uma identificação que nunca existiu entre eles garante bons momentos, pois  Arthur resolve pagar um guru canadense que lançou um livro de auto-ajuda para dar um fim em seus problemas. E as situações em que os dois se metem são absurdas, sempre acompanhados  dos amigos de banda de Arthur,  tão caricatos quanto os personagens de História Proibidas de Todd Solondz. Uma Vida Sem Regras é divertido, esteticamente ordinário, funcional, mas não consegue fugir do parâmetro traçado pelo cinema independente americano. Passa como mais um divertido filme, que usa a ingênuidade,  personagens e conflitos caricatos, buscando um novo caminho, mas com uma velha realização.

★★
Uma Vida Sem Regras (How To Be, 2008, Inglaterra) de Oliver Irving

Indie: 7 ANOS

Até onde a fidelidade pode aguentar? Quando o desejo grita para você, o que podemos considerar certo ou errado? Estas perguntas são explícitamente expostas no longa francês 7 Anos, em exibição na Mostra Indie de Cinema, em Belo Horizonte.

Temos uma amarrada e linear trama, onde Maité é casada com Vincent, que está preso, condenado a uma pena de sete anos. Sem autorização a visitas íntimas, o casal só pode trocar apenas palavras. Vincent tem esperanças, já Maité precisa de calor humano. até quando se entrega a um homem que conheceu na porta da prisão. O grande problema é que o longa necessitava de um ápice, de informações maiores para ser mais concreto, convincente e menos morno. Não existe, de fato, um trabalho maior no roteiro que uma história linear e sem sal, mesmo com uma história paralela para conhecermos melhor os sentimentos e condições de Maité.

Maité descobre que o homem no qual decidiu se entregar é o carcereiro da prisão e melhor amigo de Vincent no local. O que acusava uma trama de cíumes, traição e valores, vira uma morna história entrelaçando os desejos e sentimentos dos três, de forma amarrada, que nos leva até o fim sem problemas, mas deixando a sensação de que faltou algo.

★★
7 Anos (7 Ans, França, 2006) de Jean Pascal Hattu

Indie: LOREN CASS

Ousadia seria a palavra mais adequada para descrever o longa do estreante diretor Chris Fuller chamado Loren Cass. Chris começou a escrever o roteiro com quinze anos de idade, demorou algumas semanas filmando e alguns anos editando o material. Com vinte e quatro anos, viu o longa pronto, lançado pela sua própria produtora. Isso já seria louvável, mas o filme nos mostra um talentoso diretor.
O ano é de 1997, as rebeliões de São Petersburgo terminaram. Os jovens vivem sob a tensão da diferença racial, a constante desconfiança da polícia e nenhuma atividade, absolutamente nada para fazer. Na escola vemos os corredores vazios, um diretor alcóolatra e no banheiro, um menino carregando uma arma. Rapidamente os jovens viram reféns de seus pensamentos.

Tudo é contado de uma forma bastante subjetiva, poética, mas pesada como um soco na cara. A escolha de planos abertos acentua o vazio no coração de cada jovem mostrado no filme no meio da cidade. A cidade suja, o mundo sujo. A fotografia é inspiradora, não só pela escolha de captar as luzes da cidade, o "céu de neon" e takes mais escuros, porém com detalhes muito bonitos, que no fim mostram o objetivo que é mostrar todo o ódio, o rancor e a esperança que some a cada cigarro consumido, acentuados por reais discursos de políticos na época e a sombria narração de Blag Dahlia (vocalista da banda Dwarves). 

Não existe uma gangorra emocional no filme, temos intensidade que só aumenta a cada corte, mesmo que possa soar vazio e lento para quem não se esforçar a interpretar o roteiro que acentua a subjetividade junto com os sentimentos dos personagens, um mergulho profundo nos pensamentos e na agonia das perambulantes vidas naquela cidade.

As vidas de Nicole (que procura um sentimento maior no meio dos homens que passam por sua vida com velocidade impressionante), de Cale (que pretende fugir da cidade o mais rápido possível) e de Jason (a maior vítima do tempo e refém de si próprio e junto com Cale, entram em confusões com jovens negros em cenas brutais de violência) são acompanhadas com delicadeza mas com o peso de um elefante. Ainda acompanhamos dois limites, do jovem "punk" que vive sob efeito de drogas e vaga pelas ruas sem rumo e do Garoto Suicídio, onde Fuller conta da forma mais inteligente os seus últimos dias de vida para fugir da mesmice, encerra com a brutalidade mais clara possível. É preciso um estômago forte. O futuro não existe para todos e não é por acaso que as histórias tem a constante companhia de uma marcha fúnebre. Chris Fuller faz o angustiante retrato de vidas vazias sem ser piegas e cair na mesmice da "juventude perdida".

★★★★
Loren Cass (Idem, EUA, 2007) de Chris Fuller

Indie: RINHA

É estranho o impacto que o longa Rinha de Marcelo Galvão causa quando vemos atores brasileiros falando inglês. Um inglês digno, é verdade. Mas a fronteira das línguas não pára por ai. O português e o espanhol entram na trama também. É difícil não pensar que se trata de uma canastrice tremenda, para passar o filme como um "sucesso-gringo" e acertar a América inteira. Mas se essa é a intenção, ela falhou.

A trama se concentra em uma festa, onde os ricos, magnatas, políticos e aproveitadoras entre drogas e promiscuidade, apostam em lutas, as rinhas, onde lutadores se enfrentam dentro de uma piscina vazia. E assim vamos conhecendo o vasto e excêntrico elenco, um a um, de maneira dinâmica e eficaz. Mas esqueceram de avisar que copiar os longas Jogos, Trapaças e Dois canos fumegantes
e Snatch - Porcos e Diamantes não vale.

Entre as drogas e confusão com as línguas e diálogos bobos, o longa se desenvolve com com histórias de corrupção, blefe e vingança. Infelizmente o filme se aproxima demais com os citados filmes do diretor inglês Guy Ritchie e a inevitável alusão ao Clube da Luta de David Fincher e a justa e engraçada homenagem a Rocky.

Por outro lado, fica impossível não se divertir com uma história tão dinâmica e uma montagem funcional que usa o humor nas horas exatas para aliviar o peso das lutas e tem a duração exata para não cair no poço. A técnica é competente, comum. Sem ousadias, mas sem erros também. É uma pena que o filme tenha essa ambição e acaba soando como uma cópia de enlatados internacionais.

Rinha (Idem, Brasil, 2008) de Marcelo Galvão

Festival do Rio: SOB CONTROLE


A expectativa para ver a filha de David Lynch na direção após 15 anos era grande, assumo. E não esperando algo relacionado ao pai, pois seria algo como chutar cachorro morto, mas Jennifer nos brinda com um thriller policial onde a índole é o ponto principal em Sob Controle, seu assumido "filme B", que conta com produção de seu papai, em exibição no penúltimo dia de Festival do Rio.
 
Nos primeiros minutos Jennifer mostra para o que veio. Bons takes, captados em digital, sem tratamento na pós-produção e boas idéias. Mas infelizmente elas param nos primeiros minutos, no decorrer do longa tudo fica ordinário demais, tecnicamente falando.

A trama se passa na investigação de uma chacina em uma deserta estrada no interior americano, usando um cansativo ping-pong de imagens da investigação e de fatos que antecederam o crime. Para a investigação agentes do FBI são encarregados de tomar a ponta, já que os policiais rodoviários não dão conta disso, mas claramente com ego ferido, não ajudam muito na investigação. Assim, desenfreando em uma jornada onde corrupção, índole e muito sangue, Jennifer Lynch desenvolve seu segundo longa-metragem.

Neste ping-pong se destaca como Jennifer mostra os corruptos policiais em um bizarro esquema, não só para se dar bem financeiramente, mas para inflar o ego, mostrando que piedade não existe naquela estrada. Até sua reviravolta, que nos surpreende - acho que qualquer coisa fora desse ping-pong me surpreenderia - e casando pontos fundamentais do longa, mas que criam novos furos na trama, que só vamos nos tocar quando os créditos sobem. Jennifer tem potencial para ir longe, é ousada, assim como o pai, mas carece de um roteiro potente para mostrar sua força como cineasta, pois Sob Controle é um exercício de produção, já que ele é claramente feito em baixo orçamento, com um bom uso de atores, mas com um roteiro fraco, nada disso se salva.

Sob Controle (Surveillance, EUA, 2008) de Jennifer Lynch

Festival do Rio: NA MIRA DO CHEFE


Uma história de acerto de contas. Nada original, realmente. É mais ou menos assim que segue a trama de Na Mira do Chefe, que está em exibição.. você já sabe!

O longa infelizmente foca-se em estereótipos e na previsibilidade, mesmo com a intenção contrária. Ao retratar dois assassinos de aluguel, que por mais que tentem se adaptar, vivem em conflito de gênios. Na fuga de um furado plano, eles vão para Bruges, na Bélgica (o nome do filme em inglês é In Bruges) por ordem de seu chefe. Por lá os dois enquanto vivem experiências que passeiam entre o hilário e o banal, Collin Farrel (o mulherengo fanfarrão) e Brendan Gleesson (o culto mais contido) vivem seus esteriotipados personagens com louvor, esperando a ligação do manda-chuva para voltar para a Inglaterra.

Com o tempo vamos nos aprofundando no furado plano e consequentemente no âmago dos personagens, talvez essa a maior lavanca funcional do filme. Outro ponto a favor é o uso das luzes da cidade, o uso de uma fotografia amarelada e também com o exagero da luz branca, por outras vezes. O resultado é interessante, mas passa longe de ser algo inovador.

No mais, o filme não sai muito do que a proposta de um acerto de contas nos oferece, mas que se acerta no desfecho da história com criatividade, usando a citada lavanca com bastante criatividade. É funcional, mas não foge de cair na mesmice dos filmes do gênero.

★★
Na Mira do Chefe (In Bruges, Inglaterra, 2008) de Martin MacDonagh

Festival do Rio: CORRETIVO

O diretor grego Thanos Anastopoulos guia sua segunda obra com bruscos cortes e informações colocadas de forma inteligente é o que dá a graça a trama. A redundante frase que o filme Corretivo é a jornada de um homem para corrigir seus erros do passado é a que mais cabe aqui sem que eu estrague algo.

Yorkos ficou preso por quatro anos e decidido, lentamente, tenta colocar sua vida no lugar, mas o que ele encontra é um país guiado pela violência e pelo preconceito. O lado político é tratado de forma interessante, usando o futebol ou emprego para jogar a relação dos gregos com os albaneses ou turcos. E na partida, ele encontra um grupo de torcedores nacionalistas que o agradece. Yorkos encontra uma mulher e uma menina e as segue com diariamente. E quando digo lentamente, afirmo que o filme é para quem dormiu bem na noite anterior ou viciados em cafeína. Diálogos realmente não são necessários para nada, mas necessitamos de uma expressão, de uma montagem que possa nos dizer algo. Mas não é isso que o filme nos oferece. Temos aqui uma
trama de andamento muito lento, muitas passagens inúteis na tentativa de repetir informações por algumas vezes.

Por outro lado o roteiro nos guarda uma surpresa no meio de tantos bocejos, quando vem à tona os motivos da sua prisão, ligando pontos da trama, colocando até um pouco de vida nos personagens, usando questões existenciais e uma submissão involuntária, algo que é ordinário em nosso tempo.

Corretivo (Diorthosi, Grécia, 2007) de Thanos Anastopoulos

Festival do Rio: BALLAST

Interior dos Estados Unidos, uma vida apática, o sol raramente aparece. As alternativas para passar o tempo são nulas. O índice de suicídios é alto e uma mãe que luta para que seu filho não saia do caminho certo. Lance Hammer escolhe muito bem a estética para retratar esse frio interior americano em Ballast, que estréia neste final de semana nos Estados Unidos, mas está em exibição aqui no...você já sabe.

A trama não tem um protagonista certo, todos tem valor igual aqui. Vaga pelo garoto James, viciado e que foge dos deliquentes de sua vizinhança, por Lawrence, que perdeu seu irmão e falhou ao tentar se matar e pela mãe de James, Marlee. Como eles tentam passar por seus problemas, mas não conseguem enfrentar a hipocrisia criada pelos mesmos e como o fantasma do desânimo que ronda o local que leva todos para o fundo do poço em um raio de pouquíssimos metros e principalmente o remorso deixado nos dias passados.

Fica difícil fugir de um andamento lento, mas existe uma cadência, por vezes parece que o filme vai embalar, mas infelizmente não é o que acontece, mas o poder introspectivo acaba por salvar o longa, aliado a direção poderosa de Hammer. Marlee é o ponto forte da trama, é a que enfrenta o monstro do passado de modo mais claro. De certa forma, o longa se trata sobre corrigir o passado em uma terra que não existe opções para isso. As longas voltas para chegar em algum ponto. A lentidão é o grande problema do filme, mas é corrigido com o trabalho de foto muito bem elaborado, levando o espectador ao frio interior americano e um roteiro que acerta o alvo.

★★
Ballast (Idem, EUA, 2008) de Lance Hammer

Festival do Rio: SINEDÓQUE, NOVA IORQUE


Com roteiros bastante criativos Charlie Kaufman cedeu seus trabalhos (não só como roteirista, mas como produtor também) para diretores de vídeo-clipes como Spike Jonze com Quero ser John Malkovich e Adaptação) e Michel Gondry com Brilho Eterno de uma Mente sem Lembranças e Natureza Quase Humana. Logicamente caiu no gosto do público e dessa vez Kaufman se aventurou em dirigir sua própria viagem, digo, roteiro. O resultado se chama Sinedóque, Nova Iorque e dou um doce pra quem adivinhar onde está passando.
É lógico que Kaufman contaria a história de um diretor de teatro que lida não só com uma doença que deixa seu corpo debilitado e o previsível fim de seu casamento, o deixando sem esposa e filha do jeito mais surreal possível. Kaufman provavelmente tenha escolhido tomar o posto de diretor pois talvez outro não conseguisse interpretar seus símbolismos e analogias da mesma forma. Mas ele faz o bem o trabalho, escolhe bem takes, comanda os atores, o trabalho fotográfico e a gigantesca produção de arte com sua equipe de forma eficáz elevando o resultado final a status de clássico, pelo lado megalomaníaco do diretor. 

É um bom filme de se ver, antes de qualquer coisa. Philip Seymour Hoffman no papel do diretor Caden Cotard está incrível, como sempre. Enquanto assistia o longa, já pensava a sua indicação para o próximo Oscar. O elenco também conta com as brilhantes presenças de Samantha Morton e Jennifer Leigh.

É interessante como Kaufman continua com sua complexidade nos roteiros, mas Sinedóque é uma história linear, que por muito tempo achamos que estamos vendo um drama ordinário com bruscas passagens por um humor alá David Zucker.

O roteiro é linear até o seu fim, mas envolvido pela metalinguagem até o último fio de cabelo, quando Caden concluí que está chegando no limite e decide encenar uma peça sobre sua vida, no fim das contas. O tempo é relativo para Caden, ele pode parar e voar e o vemos colhendo reações inesperadas de quem vive em seu próprio relógio. Com uma ajuda financeira o diretor chega a fazer uma réplica de Nova Iorque para ser ensaiada por algumas décadas. A partir dai o número de analogias cresce, com o tempo não sabemos mais o que é ficção, o que é realidade, o que é sonho e o que é delíro. E o trunfo está ai, nesse labirinto de emoções criado pelo roteirista/diretor feita com muita competência, aliado as belas atuações. Emoções indiscritíveis por sinal.

Seguindo essa cartilha, ganhamos uma conclusão, que continua aliando a ficção com a realidade dada pelo roteiro em um bonito e poético fim. Kaufman estréia na direção com o pé direito e se consagra de vez como um dos mais criativos roteiristas do cinema contemporâneo.

★★
Sinedóque, Nova Iorque (Synedoch, New York, EUA, 2008) de Charlie Kaufman

Festival do Rio: JOE STRUMMER: O FUTURO ESTÁ PARA SER ESCRITO


A lista de músicos que ganham documentários aumenta com certa velocidade. Muitas bandas ganharam seus filmes como os Sex Pistols e os Ramones. Dessa vez o homenageado foi Joe Strummer, vocalista e guitarra do grupo inglês The Clash em Joe Strummer: O Futuro está para ser escrito que obviamente está em exibição no festival do Rio desse ano.
Curioso como Joe se isola dos músicos das outras bandas citadas. Joe é muito humano para ficar parado em um rótulo, mas levou consigo até o fim de sua vida o que o fez criar o Clash e seus trabalhos seguintes.

O filme tem um vasto arquivo de imagens importantíssimas e raras para os fãs de Joe. Entrevistas, imagens de arquivo pessoal, backstages e shows. A montagem do filme é inteligente, casando essas imagens com depoimentos de nomes de peso como Martin Scorsese, Jim Jarsmuch, Anthony Kieds, Steve Buscemi e Johnny Depp para citar alguns. Existe também inclusões de desenhos, animações ou imagens quando existe uma narração de Joe, algo que foi feito na íntegra no documentário Kurt Cobain - Retrato de uma Ausência, mas com uma leveza muito maior pois a vida de Joe não foi tão trágica quanto a vida do músico de Aberdeen. Semelhança nos dois existe pois Joe não conseguia lidar com o sucesso do Clash e volta e meia sabotava seus próprios projetos por suas crises emocionais, mas sempre soube ver o outro lado, mesmo com uma história conturbada.

Joe sempre foi libertário e não importava onde estava e com quem, sendo no rap, no ska, no reggae ou até mesmo no techno, oque Joe procurava era o que ele viveu no punk. Por muitas vezes andou contra o que a "cartilha" dizia e foi julgado, mas com o tempo entenderam o que Joe queria dizer.

Strummer cresceu no meio de uma salada étnica e seu sonho era ser rockeiro, influênciado pela música country americana e o documentário conta exatamente o processo de ascenção e queda do músico e a tentativa de reconstruir não apenas sua carreira após o Clash e suas férias que o rendeu uma breve carreira de ator, mas como músico junto com os Mescalleros e principalmente o que sempre esteve vivo em sua alma que parecia estar morto e algo que apenas ele poderia fazer, para ele e para todos os fãs da boa música.

★★★★

Joe Strummer: O Futuro esta para ser escrito (Joe Strummer: The Future is Unwritten, Inglaterra, 2007) de Julien Temple

Festival do Rio: SUKIYAKI WESTERN DJANGO



Takashi Miike é conhecido pelo exagero, pela abusiva violência e por colocar humor onde não estamos acostumados a ver. Para quem não conhece o diretor, com estranheza, as gargalhadas são arrancadas da platéia que estava no ápice da tensão. Todas as características de Miike estão no longa e dessa vez a direção foi feita de uma forma diferente, um método mais "americano". Não me refiro ao fato do filme ter características da terra do Tio Sam e ser falado em inglês, mas ele é construído como outros filmes americanos. A montagem não joga a favor, pois se assemelha demais a filmes do gênero, mas a excelente direção rebate a altura.

A viagem de fazer um western com características nipônicas, como casas tradicionais, vestimentas e personagens orientais aliados a um deserto, músicas de faroeste e uma cenografia muito trabalhada para casar dois mundos completamente opostos e uma produção cenográfica maravilhosa que dá um ar diferente a história convencem o espectador. A trama se foca em dois clãs que lutam brutalmente por um tesouro e expulsaram quase todos os moradores do vilarejo. Quando um atirador solitário aparece, os dois clãs lutam por ele e o jogos de interesses começam, mas por sorte temos uma história paralela a essa guerra, que se foca na vingança é de longe, muito mais interessante. Volta e meia uma passagem poética aparece para o espectador respirar no meio de tantas explosões. Prepare os seus ouvidos.

Existe uma certa aproximação com Kill Bill, não pelo roteiro, mas pelo lado estético.Pois Tarantino mantinha suas influências aliado a sua escola americana, algo que Miike faz de forma oposta. Outra ligação lógica é a presença do diretor Quentin Tarantino no filme, fã de Takashi Miike assumido.

Sukiyaki Western Django carece de profundidade para ser diferente dos outros filmes do gênero, como o próprio Kill Bill ou como Rob Zombie fez em Rejeitados pelo Diabo, pois banhos de sangue, tiros e explosões aparecem nos cinemas semanalmente. Mesmo que tenha uma ordinária história no seu subtexto, que é prejudicada pela narrativa e montagem, ele não desce goela á baixo. Miike acaba julgando sem querer seus personagens, de uma forma muito sutíl. Mas de qualquer forma, serve como um bom divertimento, muito mais que assistir a décima parte de uma franquia de milhões de dólares.

★★

Sukiyaki Western Django (Idem, Japão, 2007) de Takashi Miike

Festival do Rio: ASSIM ME DIZ A BÍBLIA

O fato de um polêmico documentário ser imparcial, mostra um poder a mais após a exibição terminar. Ele te dá a chance de não só vagar livremente sobre o assunto tratado, mas como o diretor consegue tratar algo com tamanha delicadeza para não levantar uma bandeira, mesmo que por acidente. Assim me diz a Bíblia é um documentário sobre a relação de passagens da Bíblia que supostamente se referem aos homossexuais e as consequências de todos esses anos de luta (a favor e contra) e está na mostra gay do Festival do Rio 2008.

Entrar com todos os prós ou contras prontos e só jogar na cara do espectador esperando um choque ou uma revolta sobre um assunto polêmico para a sociedade não é o que o diretor Daniel Karslake oferece no filme.

O estudo das passagens da Bíblia, o real significado de Sodoma e Gomorra para as passagens são partes importantes do documentário, que parece ser um óde as realizações de Deus nas vidas dos religiosos por algum momento, mas em questões de segundos, vira um discurso liberal daqueles que poderiam deixar R.R. Soares de cabelos em pé.

Cristãos que tem filhos gays, a luta por direitos e o mais interessante, que são os gays que amam á Deus de qualquer maneira. A luta para superar o susto de ter um filho homossexual e daqueles que simplesmente colocam tudo em risco para amar sua cria, pois o que interessa de certa forma é o amor.

O filme é bem dinâmico, não só com depoimentos mas com animações divertidas (e ácidas), imagens de arquivo que por fim dão um apelo emocional ímpar aos depoimentos.
O significado da Bíblia para muitos é o que está escrito, para outros não. Isso se torna um grande problema pois ai a interpretação de pecado muda. Esse é outro tema. Acompanhar um homem que sempre foi cristão, que se casou, teve filhos criados na igreja católica, mas sempre teve certeza de sua homosexualidade e terminar como bispo de uma Igreja, sob ameaças de morte é incrível.

Não há um mensagem que condene uma visão ou outra, mas a certeza que fica quando os créditos sobem é que Deus prega o amor e isso que devemos seguir e não o que homens dizem.

★★★★

Assim me diz a Bíblia (The Bible Tells me So, EUA, 2007) de Daniel Karslake

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