EM NOME DE DEUS


Em Nome de Deus possui duas vertentes pulsantes em sua composição: as características básicas do cinema de Brillante Mendoza, ou seja, a câmera trêmula, os planos sufocantes e a edição nausante que deram ao diretor o prêmio de melhor diretor em Cannes por Kinatay e por outro lado, padrões pré-estabelecidos movidos pela redoma do que é considerado “gênero”. Afinal, esta é a primeira vez que Mendoza foge de tramas urbanas e focadas no cotidiano para analisar eventos históricos.

Em foco, a questão da postura extremista de muçulmanos e as brechas políticas que permitem tais ações, como o sequestro de turistas, em maioria cristã, que durou cerca de um ano e meio. A mescla que gera Em Nome de Deus oferece cenas memoráveis de rica analogia usando o cenário como um personagem mais importante que sequestradores e sequestrados. Por outro lado, não o livra da mesmice na costura de elementos comuns deste assunto como o terror, pressão psicológica e a impotência, principalmente ao que sustenta a postura de vilania – apenas uma sequência no filme os coloca em xeque como seres que dividem as mesmas necessidades.

A rotina dos cativos, captada por Mendoza com a tradicional ausência do senso de unidade ao que se refere a desenvolvimento narrativo, já que analogias, tiroteios, momentos ermos e discussões políticas e religiosas dividem o roteiro sem organização – ganha opacidade por não “ter” um representante. Todos ganham seu momento de destaque, mas nenhum, incluindo Thérèse Bourgoine, interpretada por Isabelle Huppert, serve de referência para desconstrução de um tempo de extremo sofrimento. Sobra então, mesmo que em nova roupagem, a saturação.

Em Nome de Deus (Captive, França/Filipinas/Alemanha/Reino Unido, 2012) de Brillante Mendoza

CURVAS DA VIDA


Em uma de suas entrevistas emblemáticas ao The Guardian, Clint Eastwood condena o cinema feito nos EUA, feito para domesticar o público e que os coloca em zona de conforto. O famoso escapismo, para ser mais claro. Curiosamente, Curvas da Vida, filme dirigido por Robert Lorenz (escudeiro e produtor de diversos filmes recentes de Eastwood) segue tal cartilha. O drama, pautado no amor, seja por algo ou alguém, é o epitome da narrativa clássica desenhada por clichês técnicos assustadores.

O pulmão do filme está na química entre Gus (Eastwood), Mickey (Amy Adams) e Johnny (Justin Timberlake), que tem o conhecimento por baseball em comum. Quando o tema está em evidencia, o filme flui com bons diálogos e saídas certeiras, porém, quando o melodrama é moldado, tudo parece sair de controle. Fora o saturado método para exibir o conflito entre pai e filha, ambos traumatizados pelo passado, Curvas da Vida escolhe jogos de cenas sofríveis, hoje provavelmente usados em novelas ou seriados, onde a urgência está até no roteiro e não há tempo para o novo.

Lorenz, em momentos pontuais, homenageia a persona que catapultou Eastwood para a representação do macho. Referências a Dirty Harry e O Homem Sem Nome são perceptíveis e de bom diálogo com o restante da trama, mas em momento algum sustenta a falta de criatividade de Robert Lorenz. Afinal, o “tropeço” que Gus leva na primeira sequência do filme representa a fraqueza do filme: mal dirigido, afobado e, claro, “domesticado”.

Curvas da Vida (Trouble With The Curve, EUA, 2012) de Robert Lorenz

FESTIVAL 4+1

Em sua terceira edição brasileira, o Festival 4+1 se hospeda pela segunda vez consecutiva no CCBB do Rio de Janeiro. Trazendo filmes que ganharam destaque em festivais como Sundance, Cannes, Berlim e Veneza, o festival também presta homenagem ao realizador alemão Werner Herzog que estará presente no evento para aula magna especial e para apresentar o longa The Wild Blue Wonder, de 2005, ainda inédito no país. Abaixo você confere comentários sobre (quase) todos os filmes da mostra competitiva e outros que terão exibição, por exemplo, a coletânea de curtas 3.11 - Sense of Home. A programação completa do evento está disponível neste link.

Nana (Idem, França, 2011) de Valérie Massadian

Vencedor do prêmio de debut diretorial no Festival de Locarno de 2011, Nana se suporta pela sequência inicial do filme, onde a pequena menina que batiza o filme vê a morte brutal de um porco. Ela está diante da frieza do mundo e da displicência humana que se desenvolverá durante o filme. Contemplativo, o longa de Valérie Massadian coloca a protagonista à revelia do mundo e usa a inocência como eixo para questionamentos sobre amor e natalidade sem tanta criatividade.


Bellflower (Idem, EUA, 2011) de Evan Glodell

A transformação do cinema em vida. Esteticamente rico, Bellflower une o espírito nostálgico ao jovial – assim como suas fontes de inspiração no cinema -, a extremidade de cenas fortes imagética e liricamente e o contraponto do conteúdo denso à freneticidade da montagem e da narrativa. Mais um bom exemplo da funcionalidade deste modelo cinematográfico. Leia a crítica completa.
Crazy Horse (Idem, França/EUA, 2011) de Frederick Wiseman

Longe da eterna questão do real e dos tradicionais talking headsFrederick Wiseman construiu sua carreira como diretor de documentários analisando o cotidiano de instituições americanas. Em Crazy Horse, a metodologia segue intacta, mas não foge da questão sobre a inventividade do diretor. Leia a crítica completa.
Ao Abismo, Um Conto de Morte, Um conto de Vida (Into the Abyss, EUA/Reino Unido/Alemanha, 2011) de Werner Herzog

Ainda que o documentário de Herzog flerte com o formato de reportagem – mesmo longe de sensacionalismos, a potência está em como o realizador molda suas perguntas: muitas desconcertantes, outras que revestidas do acaso disfarçam o mal estar da situação e outras que ganham o silêncio como simbolismo para o lamento, independente da situação que o entrevistado esteja, todos ali tem motivo para estarem insatisfeitos levando a questão maior que é a necessidade da pena de morte em múltiplas abordagens. Leia a crítica completa.

Terri (Idem, EUA, 2011) de Azazel Jacobs
Azazel Jacobs leva a derrota – termômetro mais usado nas comédias independentes americanas contemporâneas – ao seu extremo e questiona se a imagem condiz com a verdade. Como a sequência chefe do filme representa, Terri está ali para todos. Um amigo de todos. Basta aprender a ser amigo dele mesmo. Leia a crítica completa.
3.11 - Sense of Home (Idem, Japão, 2012) de Apichatong Weerasethakul, Ariel Rotter, Catherine Cadou, Isaki Lacuesta, Jia Zhang-Ke Bong Joon-ho, Jonas Mekas, Kaori Momoi, Kazuhiro Soda, Leslie Kee, Mohd Naguib Razak, Naomi Kawase, Pedro Gonzalez Rubio, Shunji Dodo, So Yong Kim, Steven Sebring, Patti Smith, Takushi Nishinaka, Toyoko Yamasaki, Victor Erice, Wisut Ponnimit e Zhao Ye

Usando o tsunami causado por um terremoto no dia 3 de março de 2011 como ponto de partida, esta série de curtas dirigidos por nomes relevantes como Jia Zhang-Ke, Bong Joon-ho, Apichatpong Weerasethakul e Naomi Kawase (organizadora do projeto) busca a representação do desamparo de uma nação.  Movidos pelo experimentalismo, alguns conseguem tocar no assunto pela alusão, outros de forma direta como Patti Smith e Bong Joon-ho, porém o que desconecta todos estes filmes é justamente a liberdade. A variedade de linguagens e formatos solta a rédea e leva alguns a simplesmente esquecer o tema - ou impossibilitar o diálogo entre imagem e texto. O produto final é completamente irregular.
The Ballad of Genesis and Lady Jaye (Idem, EUA/França/Bélgica/Alemanha/Países Baixos, 2011) de Marie Losier

Este documentário evoca os anos sessenta e a arte de Andy Warhol, Lou Reed e David Bowie, para citar alguns. Da androginia que aponta a igualdade entre Genesis, nome dado para o garoto Neil após o trauma envolvendo a igreja e sua escolha sexual e seu eterno amor, Lady Jaye, às colagens e reconstituições, o filme de Marie Losier é livre para utilizar diversos aspectos de modelos distintos de documentário. Das narrações - que mais soam como declarações de amor - ao tour diary do grupo liderado pelo casal, está a aura desta época, mesmo que Marie Losier tenha filmado em 2006. E para coroar, acompanhamos uma legítima história de amor, aquele que se doa, que espera e tudo supera.

 

4:44 Last Day on Earth (Idem, EUA/Itália/França,2011) de Abel Ferrara

A constante análise de causa e efeito neste conto apocalíptico de Abel Ferrara não cria senso de unidade entre suas fontes. Na Nova Iorque igualmente decadente a de O Assassino da Furadeira - também com os mesmos enigmas envolvendo arte e libertação, 4:44 ensaia discursos para um novo tempo - ditatorial e intolerante com alternativas; haverá alienação, dependências, vaidade e traições até o fim e a redenção está na interpretação da vida. Ferrara, porém, confunde o propósito do filme ao limitá-lo ao pragmatismo de uma pregação redundante: verborrágico e artificial.

Verano (Idem, Chile, 2011) de José Luis Terra Leiva

Sensorial e contemplativo, Verano explora o instinto feminino num vilarejo afastado da capital. Lá, um grupo de mulheres deseja, se repreendem e, claro, falham. Um exercício que cresce conforme a proposta aflorece. Se afastar, no caso, é a ação correta para transformar personagens em objetos de identificação. Verano é remetente ao cinema de Naomi Kawase, filmado em Super 8 e integrante do 68º Festival de Veneza.
La Demora (Idem, Uruguai/México/França, 2012) de Rodrigo Plá

O que cerca La Demora é a questão da vilania; a câmera estática de Rodrigo Plá acompanha o cotidiano de María (Roxana Blanco), que além da obrigação de manter uma casa e três filhos,  é responsável pelo pai, vítima de Alzheimer. A intenção do filme, vencedor do prêmio do  júri ecumênico no Festival de Berlim, é aproximar a idéia da banalização do trágico através das sombras de sua fotografia. Nela, é possível desencadear idéias e identificar histórias similares, onde o desespero e o desamparo são dominantes.
Photographic Memory (Idem, EUA/França, 2011) de Ross McElwee

Utilizando a relação com seu filho adolescente Adrian, o cultuado documentarista Ross McElwee pretende, à priori, estudar a evolução da película e a maneira de filmar e fotografar - o fim do romantismo, o pragmatismo e o imediatismo que o tempo pede. Porém, o que vemos é uma lenta transição de propostas; a arte - matéria-prima - invade a vida do realizador, que aos poucos domina a tela, tornando o filme em um bloco de notas aberto ao público. Paralelo à relação de pai e filho, o passado ganha importância máxima para se discutir o futuro. Matemática simples feita com alma.
Life without Principle (Dyut Meng Gam, Hong Kong, 2011) de Johnnie To

Esqueça os tiroteios e cenas de ação em locais improváveis, características do cinema de Johnnie To. Em Life Without Principle, vemos um thriller expositivo sobre a teia natural que o capitalismo forma. Entre a necessidade e a ganância moram a violência, impostos e personagens vítimas do sistema das mais variadas formas. Nada que não tenha sido abordado anteriormente em óticas (e gêneros) diferentes. A sensação é de que o filme aponta a reinvenção de um realizador, porém, com efeito contrário.
Fragments (Les Éclats (Ma Guele, Ma Révolte, Ma Nom, França, 2011) de Sylvain George

O desafio de Sylvain George neste documento experimental sobre a luta de imigrantes ganeses para voltar ao seu país enquanto vivem à revelia, em um local fantasma onde só os policiais dividem o espaço é dominar a monotonia. Funcional quando analogias são criadas ou o caráter contemplativo é dado ao dispositivo e completamente entediante quando assume o modelo de documentário com depoimentos e denúncias, o filme não escapa da irregularidade.
Land of Oblivion (La Terre Outrageé, França/Alemanha/Polônia/Ucrânia, 2011) de Michale Boganim

O embolado criado por Michale Boganim a partir de Chernobil, que muitos consideram o ponto de partida do apocalipse, em 1986, é o sustento para Land of Oblivion ser um espectro antes mesmo de uma análise social. O filme busca a relação de identidade com os locais afetados e a sensação de ausência após a tragédia. Acompanhando três personagens, Boganim adormece o sensacionalismo e o drama. Seu filme é um documento frio, remetente ao cinema de Sergei Loznitsa ou Aleksey Balabanov e focado na complexidade do conformismo e no sentimento abstrato que é a saudade. Ainda que tenha norte, o filme parece perdido por não ter uma média clara entre os tópicos analisados e, principalmente, entre os personagens. 

UM ALGUÉM APAIXONADO


Do mesmo arquétipo que sustenta Cópia Fiel, filme anterior de Abbas Kiarostami, Um Alguém Apaixonado se desenvolve pelo oposto que se espera. Tal expectativa, de espectro, se transforma em personagem e posteriormente em um monstro. Kiarostami tem o prazer do flerte. Sugere ao espectador e desenha a ausência.

A câmera que raramente acompanha a ação relevante, em certos momentos prefere se omitir à história por completo. Entre um lado e outro, opta pelo meio – como a câmera posicionada no vidro, entre o restaurante e a rua na primeira sequência do filme.

A opção de subverter regras, como os telefonemas não atendidos, casais que não se tocam e o foco em diálogos corriqueiros é parte do exercício de estilo – subverter ou instigar é consequência; cabe ao público entrar no jogo de Kiarostami, acostumado a contrariar plateias domesticadas.

Porém, falta o diálogo entre os dois extremos; o exercício logo se satura e carece de inovações ou ao menos abordagens alternativas. Mesmo pulsante, a ideia é redundante. Ser apenas antítese traz automaticamente frustração, pois não se justifica como parte de um processo criativo e sim como gratuidade.

Um Alguém Apaixonado (Like Someone in Love, França/Japão, 2012) de Abbas Kiarostami

ERA UMA VEZ EU, VERÔNICA


A cada quadro de Era uma Vez Eu, Verônica, há o sentimento de nostalgia. Apesar da câmera do diretor Marcelo Gomes (Viajo Porque Preciso, Volto porque Te Amo) focar o cotidiano da residente em medicina que batiza o filme (Hermila Guedes), seu emblema contra o presente – a canção “Mira Ira”de Karina Buhr que no refrão entoa “Tá tudo padronizado” – o filme apresenta o constante estado de fuga de uma geração onde raramente se vive, pois a existência os basta.

Latente, o raio-X está em pequenos diálogos com o pai (WJ Solha) onde a mudança dos tempos se apresenta de forma crescente ou com as amigas, transparecendo a fuga do caos diário formado pelos seus pacientes, todos com problemas psicológicos semelhantes – mais um sintoma dos “novos” tempos; na barulhenta Recife, para se sentir em paz, é melhor abraçar a derrota. Aqueles que aparentemente vencem se entregam sem motivo.

O que o filme de Marcelo Gomes apresenta é o espectro de conflitos de um tempo e sua saída, adormecendo o lado dramático com raras inserções onde Hermila Guedes potencializa a ideia do “novo adulto” e a crise que o fim da juventude carrega com obrigações profissionais e emocionais, como ter um novo emprego ou um namorado. Para absorver Verônica é preciso abertura para a identificação e, principalmente, entender que a dança dos dias é muito mais abstrata do que parece.

Era Uma Vez Eu, Verônica (Idem, Brasil/França, 2012) de Marcelo Gomes

FRANKENWEENIE


De volta ao subúrbio californiano, Tim Burton não larga as alegorias que o colocam como pilar da estética gótica e dos contos sobre personagens desajeitados. Frankenweenie, extensão do curta homônimo produzido e dirigido por Burton em 1984 volta ao concretismo em relação ao espaço lúdico, usando macetes simples do cinema – fonte de inesgotáveis homenagens durante o desenvolver do filme e ao expressionismo, onde sombras e contrastes são predominantes na estética.

Se o pequeno Victor traz seu cachorrinho Sparky à vida através de elementos científicos, Burton, por outro lado, encanta aos mais velhos ao rechear sua aventura infantil com referencias ao cinema de horror; visualmente, ligamos algumas figuras a Frankenstein e A Múmia, por exemplo. Pelo comportamento e ligações irônicas, temos Godzilla e O Lobisomem. Ainda há espaço para reconstituições de sequências, às vezes ligeiras, outrora alusivas a clássicos como Nosferatu e Metrópolis.

Ainda que Frankenweenie esteja em terreno comum para o desenvolvimento narrativo e de personagens, estamos diante de uma sincera reconstituição de um mundo de imaginação e fantasia – pertinentemente ligada à solidão de um garoto sem irmãos e amigos. Esta que utiliza a inocência como algoz do choque que as figuras sinistras podem causar ao público – afinal, a ternura rapidamente faz com que adultos e crianças, por caminhos distintos, abracem o filme em poucos minutos.

 
Frankenweenie (Idem, EUA, 2012) de Tim Burton

LAURENCE ANYWAYS


O que Xavier Dolan e Quentin Tarantino têm em comum? Esta pergunta esquisita à primeira vista se justifica pela representação artística, cada um em seu tempo. Se pensarmos em termos de comparação, ambos desenvolvem seus filmes a partir de conceitos pré-estabelecidos pelo passado e hoje desfrutam da identificação do grande público. Tarantino, porém, eleva a qualidade de suas obras pela inventividade e liberdade para utilizar gêneros e referências como matéria-prima. Dolan está preso a valores estéticos e representações.

Laurence Anyways se passa nos anos 90, época em que Tarantino se consagrava ao reciclar convenções e junto à Miramax mudava o rumo do mercado cinematográfico abrindo porta para filmes independentes e o (re)surgimento de diretores como John Waters, Jim Jarmusch, Amos Poe e os contemporâneos Kevin Smith, Oliver Stone, Larry Clark e Gregg Araki. Enfim, voltando ao filme, o foco está num romance torto, cheio de idas e vindas justificadas pela mudança de sexo do protagonista, sustentadas pelo talento de Melvil Poupad e Nathalie Baye e poluído por artifícios vistos em seus primeiros filmes (Eu Matei Minha Mãe e Amores Imaginários) que dataram Dolan como referência para os jovens cinéfilos.

E o diretor privilegia o que se vê e não o que se sente – termômetro pessimista de uma geração que se saturou rapidamente e logo precisará de reinvenção e novos heróis. Em Laurence Anyways é possível notar a força que videoclipes, desfiles de moda, campanhas publicitárias, enfim, a linguagem pop tivera para a formação do autor, que apesar da velocidade para narrar, embarca numa megalomaníaca viagem de 159 minutos sem necessidade. Planos, movimentos de câmera e alusões líricas pavimentam o caminho ideal para o contexto noventista se desenvolver em paralelo à narrativa que pulsa graças ao silencioso embate de Laurence com sua sexualidade,  indo além dos trajes e afirmações sobre suas escolhas.

A inovação textual chegou para o diretor em seu terceiro filme, porém é preciso livrar-se das amarras conceituais ao que se refere à linguagem unilateral. Transformar qualquer coisa que apareça em algo digestível e pop é curvar-se para seu público. Assim como sua geração, Dolan necessita de desafios e (re)invenções.

Laurence Anyways (Idem, Canadá/França, 2012) de Xavier Dolan

MARGARET


Muitos tentaram usar a analogias como recurso político ou existencial como ferramenta narrativa apó os ataques de 11/09. Tal metodologia ganha nova identidade em Margaret, longa que marca o retorno de Kenneth Lonergan (Conte Comigo) à direção em um filme coeso, que lentamente disseca o posicionamento americano perante todos os poréns que justificam o ataque terrorista e seus desdobramentos.

Do acidente que traumatiza a estudante Lisa Cohen (Anna Paquin em performance impressionante), acompanhamos um filme-cotidiano com insinuações de duplicidade que aos poucos dominam a história até contaminar toda a tela numa pequena e brilhante cena - sem atores, sem diálogos, apenas Nova Iorque.
Lisa está longe de ser uma boa moça. Ela é a epítome da hipocrisia americana, acostumada a resolver e equiparar sentimentos com acordos judiciais geralmente associados às quantias astronômicas - e que pode manipular isso para o bem ou para o mal. O que importa mesmo é se sentir completo - pelo menos para quem vê de fora.

Lonergan utiliza elementos comuns como a rotina de um colégio ou relações amorosas para elaborar este raciocínio aberto ao julgamento do espectador; ego, dinheiro, sofisticação, arte e amizade parecem ingredientes para uma bomba-relógio pronta para ferir quem a produziu.

Como um círculo vicioso com discussões calorosas sobre crença e comportamento, Margaret levanta a bola e se esquiva de qualquer resposta grosseira. Seu intuito é instigar a explosão sem qualquer tipo de afirmação. E o dever é cumprido com louvor.

Margaret (Idem, EUA, 2011) de Kenneth Lonergan

Melhores Filmes de 2023

Mangosteen de Tulapop Saenjaroen Mais um longo post com os melhores filmes do ano. São os melhores filmes lançados entre 2021-23 com mais ...