HITCHCOCK



Entre Sacha Gervasi, o diretor, e o mito, supostamente analisado, existe um abismo. A relação que intenciona a ser ambivalente, revela que sua coluna narrativa é um personagem intocável, sem eixos, caricato. Pouco se sabe do homem e é possível dizer o mesmo da persona que era uma máquina de fazer filmes. Alfred, o outro diretor, é figura pouco presente. O homem, inexistente. Por escolha, Gervasi deixa Psicose de lado e assim, limita seu debut à prestações de tributo. Como documento histórico – ao menos para o cinema – que configura a feitura do marco para o gênero de terror/suspense dirigido por Alfred Hitchcock em 1960, falta lucidez na apropriação deste momento.

Gervasi, mais conhecido pela direção do documentário Anvil, não toma a figura do diretor inglês para si. Muito menos a produção do filme ou conflitos que rondavam a vida do diretor. Estas intenções são imagéticas ou sem força representativa. Curiosamente, conflitos e manipulações sempre foram carro-chefe do cinema do homem homenageado. Em Hitchcock, o protagonista, ao contrário do recente The Girl, concentrado na produção de Os Pássaros, é colocado na posição de vítima. De sua equipe, de sua esposa Alma e do filme que o consagraria.

Destinado a manter-se à superfície, Hitchcock tem fronteiras relacionadas ao prazer do público - a cena do chuveiro em Psicose, o humor negro do realizador e os diálogos ríspidos representados com louvor por Anthony Hopkins e Helen Mirren. Limitar o campo justificando a identificação do grande público é autoboicote; ainda que seja baseado no livro escrito por Stephen Rebello sobre os bastidores do longa-metragem, o campo, dentro do tema, é rico o suficiente para mergulharmos na figura (pública ou não) de Alfred Hitchcock. Portanto, fica claro o receio de Gervasi em buscar ou recriar o âmago do protagonista. Seja pela subversão como realizador ou pela desconstrução do caráter frio e distante de uma máquina que se recusou a parar.

Hitchcock (Idem, EUA, 2012) de Sacha Gervasi

Filmes esperados para 2013

Passada a temporada do Oscar, é hora de formular a tradicional lista de filmes esperados para o restante do ano. Curiosamente, alguns filmes se repetirão em relação à lista de 2012, afinal, alguns tiveram estreia adiada e outros, previstos para estrear no ano passado, só ficaram prontos em 2013. Vamos a ela, a (nem tanto) aguardada lista de filmes esperados para 2013!


Only Lovers Left Alive, de Jim Jarmusch

Dois vampiros apaixonados. Calma, eu sei que você conhece uma história semelhante. Este é dirigido por Jim Jarmusch (Sobre Café e Cigarros, Permanent Vacation) e estrelado por Tilda Swinton, Tom Hiddleston e Mia Wasikowska. O longa conta a história de um vampiro roqueiro deprimido que séculos depois reencontra sua amada. A previsão é que o filme tenha sua première no Festival de Cannes. Lembrando que o último e incrível filme de Jarmusch, Os Limites do Controle, foi comprado para distribuição no Brasil em 2009 e até hoje não foi lançado. Nem mesmo em DVD.
Inside Llewyn Davis, de Joel e Ethan Coen

A verdade é que qualquer coisa que os irmãos Coen façam, haverá expectativa. Um Homem Sério, Onde os Fracos Não Tem Vez, Barton Fink e Gosto de Sangue, para citar alguns filmes da dupla justificam a ansiedade. A estreia mundial está programada para o Festival de Cannes. O longa não tem distribuição assegurada no Brasil, mas isso é questão de tempo, claro. No elenco, Carey Mulligan, Oscar Isaac e Justin Timberlake.

Only God Forgives, de Nicolas Winding Refn

Também com previsão de estreia para o Festival de Cannes, Only God Forgives marca o retorno da dupla Nicolas Winding Refn/Ryan Gosling, responsáveis por Drive, filme que deu a Refn o prêmio de melhor diretor em Cannes. Ainda sem distribuição no Brasil assegurada, mas, como os filmes dos Coen, é questão de tempo para ter seu lançamento anunciado por aqui.

Nymphomaniac, de Lars Von Trier

Mais um esperado em Cannes, mesmo depois da polêmica envolvendo o diretor durante o lançamento de Melancolia, na qual o mesmo afirmou, em tom irônico, que era nazista. Pelo argumento de Nymphomaniac é possível remeter aos dois lados da carreira de Lars Von Trier; dos tempos de Dogma 95 e da nova fase existencialista e crua (ou, dependendo do filme, exageradamente estilizado). A Califórnia  Filmes distribuirá o filme no Brasil, ainda sem data de estreia confirmada.

Doce Amianto, de Guto Parente e Uirá dos Reis

Mesmo sem participar da mostra competitiva da última Mostra de Cinema de Tiradentes, Doce Amianto ganhou destaque após ovação por crítica e público, inclusive forçando a organização do evento a dar espaço na grade de programação para mais uma exibição do filme. Longa do coletivo Alumbramento, responsável por pérolas como Estrada Para Ythaca e Os Monstros, Doce Amianto mostra nova faceta (de parte) do grupo, focado em gênero, referências líricas e estéticas sobretudo ao glam e o cinema de João Pedro Rodrigues e Rainer Werner Fassbinder. A distribuição no Brasil é da Vitrine Filmes, mas sem data de estreia prevista.

Kick-Ass 2, de Jeff Wadlow

Sem o diretor original Matthew Vaughn, fica a dúvida sobre a qualidade da sequência deste que é um dos mais divertidos e violentos filmes de heróis já feitos. Desta vez, Red Mist (Christopher Mintz-Plasse) tem um plano de vingança e Kick-Ass resolve lutar contra o mal através do método que o consagrou - ao lado de pessoas que se fantasiam para fazer justiça.  A aventura chega aos cinemas do Brasil no dia 13 de setembro, via Universal Pictures.

Segredos de Sangue,  de Park Chan-wook

Debut do diretor de Oldboy no mercado americano, Segredos de Sangue foca na figura de India (Mia Wasikowska), que após a morte do pai ganha um novo inquilino em sua casa: Charlie, seu misterioso tio, no qual ela nunca havia ouvido falar. A Fox distribuirá o filme nos cinemas brasileiros a partir de 3 de maio.

Spring Breakers, de Harmony Korine

Seguindo a tradição, o lançamento do novo longa de Harmony Korine foi coberto de polêmicas no último Festival de Veneza, onde ganhou menção honrosa. O filme acompanha a história de quatro garotas que roubam um restaurante para conseguir dinheiro para o Spring Break e se vêem reféns de um traficante (James Franco). Se ganhar distribuição em DVD no Brasil já é um milagre.

O Uivo da Gaita/O Rio Nos Pertence, de  Bruno  Safadi e Ricardo Pretti

Filmes do projeto "Operação Sônia Silk", homenagem  ao personagem de Helena Ignez em Copacabana Mon Amour de Rogério Sganzerla, O Uivo da Gaita e O Rio Nos Pertence foram feitos pela mesma equipe em três semanas, fora um documentário sobre o processo de filmagem. Em parceria com a atriz Leandra Leal e co-produção do Canal Brasil, o projeto marca a união de cineastas autorais e independentes com estrelas da TV. Ambos tiveram première no último Festival de Rotterdam.  Sem data de estreia prevista no Brasil.

A Caça, de Thomas Vinterberg

A expectativa fica pela questão se o eterno diretor de Festa de Família voltou à boa forma de vez  após o intenso Submarino ou voltará a dirigir fiascos, como fez após seu memorável debut, ainda sob as regras do Dogma 95. A previsão de estreia é para 22 de março, via Califórnia Filmes.

É  o Fim, de Evan Goldberg e Seth Rogen

Em forma de mockumentary, Seth Rogen, James Franco, Jonah Hill e outros da turma de Judd Apatow enfrentam o apocalipse durante uma festa. É a chance de renovo  para os responsáveis por comédias como Superbad, Ligeiramente Grávidos e Paul - O Alien Fugitivo. Estreia prevista para 27 de setembro com distribuição da Sony Pictures.
The Grandmaster, de Wong Kar Wai

Depois de quatro anos em produção, The Grandmaster finalmente teve sua première no último Festival de Berlim. A história de Ip Man, homem que treinou ninguém menos que Bruce Lee pela ótica de Wong Kar Wai tem distribuição da Califórnia Filmes no Brasil, mas sem data de estreia definida. 
Cores, de Francisco Garcia

Integrante da seleção da última Semana dos Realizadores e da 36ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo, Cores  é o retrato daqueles que não ultrapassaram os limites da vida adulta, vivem em um país em suposto crescimento e vivem asfixiados pela megalópole que é São Paulo. O filme, que recebeu da crítica comparações ao clássico Estranhos no Paraíso de Jim Jarmusch, principalmente por apontar contradições de seus personagens e o caráter pessimista de cada um, tem estreia prevista para 3 de maio, com distribuição da Pandora Filmes.

The Lords of Salem, de Rob Zombie

Após o atraso que possibilitou apenas sua première no último Festival de Cinema de Toronto, o novo longa de Rob Zombie tem lançamento em abril nos EUA. É provável que chegue ao Brasil via home video. É chegada a hora de Zombie provar para o que veio; Seus dois primeiros filmes tem veia autoral, porém, tudo deslanchou na franquia Halloween. The Lords of Salem é um declarado tributo aos filmes de Ken  Russel e Stanley Kubrick.

Elena, de Petra Costa

Também integrante da IV Semana dos Realizadores e grande vencedor do último Festival de Brasília, Elena ganhou destaque da crítica por seu caráter pungente ao retratar o resgate do passado, e também da esperança de um futuro brilhante. Entre a diretora Petra Costa e Elena, apesar do que se espera, não existe nenhum abismo. Estreia prevista para 12 de abril, via Espaço Filmes.

Outros filmes esperados para 2013: The Place Beyond The Pines de Derek Cianfrance, Machete Kills de Robert Rodriguez, O Cavaleiro Solitário de Gore Verbinski, Straw Shield do incansável Takashi Miike, To The Wonder de Terrence Malick, Don Jon's Addiction de Joseph Gordon-Levitt, Eu Não Faço a Menor Idéia do que Eu Tô Fazendo com a Minha Vida de Matheus Souza, Triple Nine de John Hillcoat, Before Midnight de Richard Linklater e Blind Detective de Johnnie To.

DESCOBRINDO O AMOR


Apesar do título de filme "acessível", Descobrindo o Amor nada mais é que um grande desafio em relação aos moldes narrativos do cinema americano. O filme de Whit Stillman (Metropolitan), selecionado para os festivais de Veneza e Toronto enfrenta convenções cinematográficas de maneira criativa: adota um gênero consagrado (comédia teenager) e nele constrói diversas armadilhas bem humoradas.

Através de um grupo de adolescentes amigas de quarto e que mantém o grupo de ajuda a alunos com pensamentos suicidas, Stillman, neste campo, subverte estruturas narrativas ao concentrar-se na verborragia para diluir conflitos e características de infinitos personagens. Caem os mitos e funcionalidades de um gênero.

Nele, vemos um filme em monocórdio – o que beneficia a fina ironia de Stillman em adotar outros gêneros como ferramenta crítica. O embate é direto com o público; O que ele consome? O que o edifica? Como gasta o seu tempo? Só não enxerga quem não quer – ou está ocupado sendo domesticado por mais um plano de grandes corporações.

Adotar a fórmula que mais angaria jovens para às salas de cinema, além de um grito contra dogmas e convenções, é a comprovação de Stillman em sintonia com a percepção contemporânea em usar o cinema como matéria-prima para seu discurso.

Descobrindo o Amor (Damsels in Distress, EUA, 2011) de Whit Stillman

A HORA MAIS ESCURA


Sem idealismos em relação à inerência de guerra e política, curiosamente, A Hora Mais Escura falha. Justamente por o ser minucioso exercício observacional da caça ao terrorista Osama Bin Laden e revela-se como um filme tremendamente humano por atrelar-se à fadiga e ou cansaço de longos anos atrás de uma duvidosa glória.

Matéria intrínseca do cinema de Kathryn Bigelow, o gênero faz-se dormente, norteando o caminho iniciado em Guerra ao Terror, onde seu maior êxito está na ausência da ação. Ainda que sair incólume de A Hora Mais Escura seja tarefa árdua, por ainda abraçar a ideia de espetáculo e a demanda de público e associações, os dez anos entre os ataques às torres do World Trade Center e a morte do terrorista são abordados por Bigelow, entre enquadramentos burocráticos e cansativos planos/contraplanos verborrágicos, como suas investigações utópicas.

A recompensa, ou melhor, o êxito, é magro. A matemática é simples, pois ao se distanciar de seus personagens e usá-los apenas em suas funções profissionais – em grande parte descartáveis e em grande rodízio, a figuras de Bigelow e Maya (Jessica Chastain) são como reflexo da subversão que caberia comparações à escolha de Bigelow e o gênero de ação ou o da perseverança americana em busca de “justiça”. Maya, afinal, não é protagonista ou ponto de identificação e sim suporte para noção de continuidade.

Portanto, A Hora Mais Escura se exibe como um protótipo pois adota gêneros e não os utiliza. Determina o drama como novo suporte, mas dispensa grandes anseios. Ação e thriller estão lá, mas sem um vilão – ou ao menos a construção de um. Apoiar todo seu conteúdo na figura de Maya e a longa duração em metodologia saturada faz o filme irregular.

 
A Hora Mais Escura (Zero Dark Thirty, EUA, 2012) de Kathryn Bigelow

O VOO


Filme que marca o retorno de Robert Zemeckis (Forrest Gump, De Volta Para o Futuro) ao cinema live-action, O Voo faz parte de um segmento orientado por preocupações mercantilistas, atrelado ao aspecto melodramático, sem diálogos diretos e representações estéticas ou naturais – apesar de seu tema ser recorrente o suficiente para identificações.

Verborrágico, O Voo se concentra na montanha-russa que é a vida de Whip, piloto de avião alcoólatra envolvido em polêmica após acidente de avião, no qual boa parte da tripulação sai com vida. As falhas – sim, uma triste metáfora - de Whip, são amplificadas pela entrega de Denzel Washington. Em paralelo, a vida de Nicole (Kelly Reilly), junkie em constante busca de redenção é claro contraponto à filosofia destrutiva de Whip.

A investigação técnica que foca a conduta do piloto serve para Zemeckis como eixo dramático; nela, está a manipulação necessária para o filme se justificar. Whip vive seu apocalipse particular e a mensagem, cristã, transparece possibilidades para o recomeço. O Voo aos poucos traça luta contra a obviedade e o mau gosto tradicional de um vídeo de autoajuda.

Com estes ingredientes, Zemeckis busca, antes de qualquer coisa, sua própria convicção. A mensagem edificante, com intuito contagiante, parece no lugar errado entre tantos clichês. Afinal, o que vemos é uma constante, até o seu limite,  maior que a moral, inclusive.

O Voo (Flight, EUA, 2012) de Robert Zemeckis

BAD ASS: ACIMA DA LEI

Apesar de nunca extintos, os filmes exploitation tiveram resgate pelos idos de 2007 após o lançamento de Grindhouse, projeto de Quentin Tarantino e Robert Rodriguez que englobava À Prova de Morte e Planeta Terror, filmes de baixo orçamento com violência, nudez, palavrões e na técnica, péssimos efeitos especiais e finalização propositalmente ruim. De lá pra cá diversos gêneros se apoiaram nesta justificativa e muitos buscavam a essência destes filmes, que é a diversão e a falta de moral. Alguns, inclusive, conseguiram distribuição no Brasil como O Vingador e Machete.

Bad Ass: Acima da Lei se vende como um filme deste segmento – seja na arte, na trilha ou na sempre pertinente escolha de Danny Trejo como protagonista, ator que é símbolo de filmes que estão à margem do grande público. Porém, o filme dirigido por Craig Moss curiosamente segue o caminho da moralidade. Há espaço para críticas – principalmente para a inversa intolerância às minorias na fronteira entre México e EUA. Bad Ass, o protagonista, filho de uma Mexicana e aposentado por invalidez após defender os EUA na guerra, nunca é anti-herói; sua posição é consequente, não uma escolha filosófica ou pura falta de amor à vida.

Há muitas justificativas em Bad Ass: Acima da Lei. Perde-se muito esmiuçando dramas e forçando empatia por personagens secundários. A consequência – ou a tão aguardada anarquia traduzida em violência e o característico pessimismo que ronda uma história composta somente por vilões, não acontece. Bad Ass: Acima da Lei, assim, nada mais é que uma propaganda enganosa, sem autenticidade, suportado pela linguagem de clipes e, de forma maquiada, busca a moral e a esperança. A famosa utopia americana.

 
Bad Ass: Acima da Lei (Bad Ass, EUA, 2012) de Craig Moss

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