Entrevista: Petrus Cariry

Em seu segundo filme, Petrus Cariry já coleciona prêmios. O mais recente, do festival de cinema do Uruguai por Mãe e Filha, obra-prima remetente aos filmes de Aleksandr Sokurov e Béla Tarr. O filme entra em cartaz nesta sexta-feira (18) via Lume Filmes. O Cinemaorama bateu um papo com o diretor.

01) As locações de "Mãe e Filha" surgiram das filmagens do curta "Dos Restos e das Solidões".  Qual foi a influência destas locações na produção do roteiro do filme?

A cidade de Cococi teve uma influencia muito grande na forma como escrevi esse roteiro em parceria com o Firmino Holanda e o Rosemberg Cariry. Eu já conhecia bem as locações por conta do curta “Dos restos e das Solidões”. A partir de várias discursões sobre o argumento original, chegamos à forma final do roteiro de “Mãe e Filha”, um filme que versa sobre a morte e sobre o fim das coisas. Hoje eu posso afirmar que o filme não teria a mesma força se não tivesse sido feito em Cococi, uma cidade fantasma real que chegou ao fim e que teve uma história feita de violência e sangue.

02) O isolamento vindo daquela cidade fantasma cria uma relação metafórica e igualmente direta com a morte. A cidade é o complemento do simbolismo que "Mãe e Filha" carrega?
As próprias ruínas já indicam a impermanência das coisas, o fim. A Mãe espera um marido que partiu há dezenas de anos. A Mãe projeta no neto morto todos os seus amores, esperanças e desejos que foram amputados pela vida. O conflito entre a Mãe e a Filha se dá porque uma quer que o “morto” viva novamente, e a outra quer que o “morto” seja enterrado e esquecido, para que a vida siga o seu ciclo natural e cósmico. As ruínas da cidade, nas lonjuras do sertão, são também habitadas por fantasmas ancestrais, que são as sombras da alma.

03) O longa é absolutamente sensorial. Como foi o processo de pós-produção para amplificar esta idéia?
Eu sempre dei uma atenção muito grande para os aspectos técnicos da pós-produção, mas no caso do filme “Mãe e Filha” eu fiz pessoalmente um trabalho de correção de cor, para realçar a fotografia que eu queria, que seria a diminuição da saturação, com aumento dos tons cinzas e o aumento do contraste das zonas escuras. Mas o grande desafio que tivemos foi no som (edição, mixagem e desenho de som), foram meses de trabalho exaustivo e muita pesquisa em busca do “clima sensorial” que era exigido pela película. O meu grande parceiro neste trabalho foi o Érico Paiva (Sapão) que fez a engenharia de áudio e contribui-o de forma decisiva nas questões criativas.


04) "Mãe e Filha" tem um embate direto com a dimensão do tempo. Em dias tão urgentes no qual a vida passa com muita velocidade, como o fascínio por tal consumação se dá no roteiro?
O uso dos tempos distendidos e da contemplação, não me diz muita coisa, se não houver o intuito de se narrar uma estória. A minha relação com o tempo no “Mãe e Filha”  é justamente buscar criar uma atmosfera de imersão e uma sensação real que o tempo escorre pela tela. O dispositivo narrativo não pode ser dissociado do conteúdo, ou melhor, até pode para poder gerar fissões.

05) Você acredita que o cinema nacional passa por um processo de "indiscriminilização" ou o aumento  de venda de ingressos de filmes brasileiros apetecem apenas os filmes de divulgação em massa?

Da minha parte não existe uma negação do cinema “blockbuster” exibido nos grandes circuitos brasileiros. Porém, é preciso que esse tipo de “cinema” não seja tão sufocante que impeça o realizador que busca um cinema mais autoral, de conseguir rodar e distribuir o seu filme com um mínimo de dignidade.

06) "Mãe e Filha" ganhou prêmios internacionais também. Existe previsão de distribuição internacional?

Recentemente ganhamos o prêmio de “Melhor Filme” no Festival Internacional de Cinema do Uruguay e isso é bom, porque de certa forma temos mais visibilidade para o filme. Existem várias propostas de distribuição que estão sendo analisadas, inclusive em países da América do Sul, como Argentina e Uruguai. Temos planos também para distribuir na Europa, principalmente em Bluray e DVD, vamos à luta.

Leia a crítica de MÃE E FILHA

2 comentários:

Melhores Filmes de 2023

Mangosteen de Tulapop Saenjaroen Mais um longo post com os melhores filmes do ano. São os melhores filmes lançados entre 2021-23 com mais ...